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O Cristão e a Cultura: Os Cristãos em Babel e seus desafios

Nessa “cultura de Babel” que parece uma inclinação do inferno para a destruição, os cristãos devem aprender a ver que a armadura de Deus nos prepara para lutar contra domínios e potestades, contra forças da escuridão e espíritos maus (Ef 6.12).

Os cristãos não podem se deixar atrair para a estrada da contracriação. Em vez disso, devem seguir o caminho da renovação. Estamos no caminho para a nova Jerusalém, e precisamos ser conduzidos a ele de forma contínua. A remoção de Babel e a luta contra ela colocará o cristão na posição de estrangeiro e portador da cruz.

Esse será o tipo de testemunho encontrado em Apocalipse 11. Ele é uma profecia e ao mesmo tempo uma advertência para o retorno às normas divinas, que ensinam e permitem a verdadeira liberdade e responsabilidade.

Não podemos de boa-fé evitar o mundo. A “cultura de Babel” é uma perversão do Reino de Deus que se alimenta das forças do Reino de Deus. A Bíblia a chama “cultura da escuridão”, e a escuridão não pode extinguir a luz que irrompeu sobre este mundo com a vinda de Cristo (Jo 1.5).

Mediante a vinda do Reino de Deus a cultura de Babel será julgada

A perspectiva de renovação, representada pela glorificação de Cristo, é a perspectiva de pensamento e ação responsável.

Se os homens da ciência, tecnologia, economia e política fizerem escolhas responsáveis, normativas, a ciência e a tecnologia não serão mais forças ameaçadoras. Elas contarão com possibilidades fascinantes na pesquisa atual para divulgar os segredos da criação.

Para essa descoberta e revelação não haveria fim. Já o caminho que conduz ao reinado do homem sempre ameaça o fim, pois ameaça a humanidade com seus desdobramentos destrutivos e demoníacos.

Se mais uma vez os homens descobrirem o caminho da normatividade na ciência, tecnologia, economia e política, ou em outras palavras, buscarem o Reino de Deus de forma responsável, seus esforços gerariam muitos problemas.

A maneira certa de seguir os mandamentos de Deus seria arriscada, pelo fato de muitas estruturas culturais atualmente estarem bloqueadas na perspectiva do reino humano. Precisamos aceitar esse obstáculo quando procuramos prosseguir com a nossa perspectiva cristã sobre a cultura.

Teríamos primeiro de reconhecer a situação existente e encontrar maneiras de lidar com ela, pois somos sempre tentados a acomodar-nos com a natureza e poder da cultura de Babel.

Está cada vez mais difícil para o cristão viver na cultura de Babel e ainda assim não fazer parte dela

Escolher a responsabilidade de estar coram Deo [diante de Deus] significa resistir às forças poderosas da ambição humana e de suas vontades.

Responsabilidade também significa rejeitar a revolução. As mudanças revolucionárias são incapazes de fornecer soluções para os estados de ilegalidade existentes, pois elas mesmas não possuem nenhuma lei.

Os cristãos enfrentam a enorme tarefa de começar com a situação existente, decadente e tentar renová-la, utilizando as normas dadas por Deus.

Se os cristãos tivessem mais discernimento sobre o que de fato acontece no mundo, eles seriam menos enganados por motivações mundanas. A compreensão do mundo deve consistir na base de sua apologética, em especial quando eles tentam usar ações de princípios em atividades culturais.

Nossa cultura hoje tende para o niilismo, e parece que os cristãos são muito propensos a escolher a tecnocracia ou a revolução. Muitas vezes vemos jovens cristãos tomando partido, e depois trocando-o pelo oposto. Há sempre argumentos convincentes em ambos os lados.

O ponto de vista vencedor é então modificado e acomodado antes de se tornar uma atitude cristã. Por meio dessa oscilação e compromisso, o pensamento político cristão e suas ações nos países da Europa Ocidental têm praticamente tudo, mas perderam a dinâmica central.

Por que isso aconteceu?

Porque os cristãos não conseguiram reconhecer o conflito espiritual inerente aos motivos culturais que determinam o desenvolvimento contemporâneo.

No passado, as armas da apologética defendiam a fé cristã contra a força espiritual do paganismo. Defesa semelhante deve ser configurada agora contra o neopaganismo, a força espiritual moderna e a marca registrada da cultura secular.

Essa apologética deveria enfrentar com ardor filosofias, ideologias e sistemas de pensamento que, como falsas revelações, desejavam muito fazer o poder religioso apostatar.

A apologética cristã deve propor a visão unitária do homem biblicamente responsável, normativa, cultural e histórica.

Ela ajudará os cristãos a testar os espíritos e permitir à igreja lembrar a seus membros o privilégio de ter o Reino e o modo de vida acessível a ele, a despeito de toda a angústia e problemas que surgirem na cultura conducente à morte.

Desenvolvimento da consciência ética

Temos lidado com os problemas da vida cultural científica e tecnológica, salientando que esses problemas são sinais da ambição obstinada do homem para formar a cultura.

Escapar da estrada que leva à morte só é possível se as pessoas escolherem um caminho diferente. E afirmamos que a missão profética da igreja é apontar o melhor caminho.

No entanto, devido às limitações legítimas da igreja, não podemos resolver a crise tecnológica. Para essa tarefa, há cristãos vocacionados, em sentido individual ou grupal.

A tarefa da igreja é advertir contra motivos errados. O caminho certo pode ser percorrido apenas se nos permitimos ser guiados pela sabedoria bíblica, que embora antiga, permanece sempre nova e relevante.

Na dinâmica bíblica, o homem não é o centro da realidade, ele não é uma criatura totalmente obstinada e ambiciosa. A Escritura mostra a criação do homem à imagem de Deus e, portanto, enfatiza sua responsabilidade. Como criatura responsável, o homem deve amar a Deus acima de tudo e o próximo como a si mesmo.

Os resultados políticos e práticos desse amor implicariam em o homem desistir do desejo de poder e procurar promover a justiça e a retidão. Para a economia, o amor significa que as motivações dele não são mais impulsionadas só pelo lucro, mas pelo exercício da administração responsável.

Para a ciência, o amor significa que o conhecimento não é mais a força bruta, mas serve ao interesse da sabedoria. É preciso considerar a ciência e a tecnologia servas úteis da humanidade, em vez de mestras tirânicas.

Não precisamos negar o grande significado da ciência ou da tecnologia

No entanto, devemos resistir à crença na independência do homem obstinado que se tornou parte dela. Por meio da fé apostatada do homem, o desenvolvimento da ciência e tecnologia tende a determinar o curso de nossa cultura.

Na verdade, sua função deve ser limitada a um meio que leva à elaboração da cultura. A ciência e a tecnologia precisam ser submetidas a pensamentos e ações responsáveis.

Podemos entender melhor o serviço que a ciência e a tecnologia prestaram à cultura quando voltamos aos motivos originais. A Bíblia nos ensina que o homem recebeu permissão para usar a criação como base, mas apenas com o intuito de preservá-la.

Manter apenas a criação, sem desenvolver a cultura deixa o homem caído refém das forças naturais. Já construir sem cogitar a preservação significa ser arrogante.

Ignorar a preservação criteriosa e discreta acabará se transformando em uma situação em que os perigos naturais são substituídos por perigos culturais; as forças tecnológicas prejudiciais ameaçarão provocar a ruína total.

No contexto de sua vocação harmoniosa para construir e preservar, o homem se vê como imagem divina. Edificar e conservar confirmam seu amor em relação ao Criador e Redentor. Assim, ele trata a criação com a preocupação e respeito merecidos.

A humanidade responsável reconhece a necessidade de desenvolver a criação e resistir a todas as formas de distorção e desordem. Caso o homem permita ser habilitado pelas normas bíblicas, seu esforço cultural pode ser uma bênção mesmo para o reino da natureza.

Isso ocorreu nos dias do rei Salomão (1Rs 4.33,34)

Como agora também pode ser, se permitirmos que nossa economia, política, ciência e tecnologia se tornem ações harmoniosas para construir e preservar, ou dito de outra maneira: se eles se tornarem parte da busca pelo Reino de Deus.

Sem dúvida, não é fácil alcançar a interação harmoniosa entre construção e preservação. Muitas pessoas vão resistir com força ao sentido bíblico. Mesmo depois da rejeição dos ídolos da ciência e da tecnologia, muitas pessoas se voltam para outros ídolos, como o da liberdade revolucionária ou da natureza.

Outros tentam projetar uma estratégia modificada para a ciência e tecnologia, mas continuam com uma visão fechada do mundo e da vida que ainda exclui a Deus.

Todavia, Deus não se permite ser excluído, e assim faz com que os desenvolvimentos culturais desse mundo fechado deem errado. Nós reconhecemos seu juízo aqui, e ainda, ao mesmo tempo, ouvimos seu chamado para voltarmos para ele e seguirmos suas normas — isso nos dá esperança.

O horizonte dela é o horizonte do Reino de Deus, que será o cumprimento da reconciliação e renovação de toda a criação. Com essa perspectiva, não precisamos nos considerar peregrinos ou espectadores em todo o mundo.

Mas sim cidadãos do Reino que veio uma vez com Cristo e virá novamente. Nós pertencemos a este mundo, mesmo estando exilados na cultura de Babel.

Exilados sim — embora não sejamos construtores da cultura hostil —, também não somos seus escravos

Nossa relação com a cultura é uma das tensões. A exigência do Deus de amor que rejeita essa cultura também demanda que a solucionemos, baseando-nos no amor.

Assim, o cristão não pode evitar seu ambiente cultural, mas também não pode esperar para ver muitos frutos do seu mandato em uma cultura tão hostil. O conceito bíblico de viver e atuar no amor e na graça de Deus é diametralmente oposto ao conceito cultural de Babel.

A Bíblia rejeita de modo absoluto a pretensão humana que, com o uso da ciência e tecnologia, pode elaborar uma contracriação, à qual ele mesmo atribua significado.

A Escritura nos chama a viver e trabalhar reconhecendo a ordem da criação, e confessando que só Cristo pode dar sentido e expectativa de renovação. Em Cristo, o Reino de Deus já foi dado a nós, e no seu regresso, nos será dado nas dimensões recriadas.

Essa é a verdadeira visão da história. Essa perspectiva não pode ser alterada pelas pretensões da norma cultural de Babel. A perspectiva bíblica parece nos dar recursos com os quais combatemos a redução do significado da cultura na ciência e tecnologia, pois endereça nossa atenção para o rico e inesgotável significado.

A cultura de Babel reduz a ciência à caricatura da verdade

Como exilados, podemos testemunhar seu significado autêntico e pleno, concentrando-nos no significado originário e normativo.

Essas preocupações globais sobre a temperatura, o armamento nuclear, a biotecnologia, os problemas da informática e energia, como também problemas pessoais, como o aborto, crime, a dissolução do matrimônio e da família e a crescente decadência da nossa sociedade, problemas com raízes pessoais que assumiram proporções enormes.

Vivendo no meio de todas essas oscilações e perversões, os cristãos precisam portar-se de forma responsável, o que significa servir e ao mesmo tempo testemunhar os valores que a sociedade deve honrar. Por isso, os esforços pessoais não devem ser esquecidos, pois a reforma cultural deve começar nessas áreas.

Muitas vezes pensamos em dimensões globais e analisamos nossa cultura como parte da cultura global, mas devemos começar pelos pequenos esforços culturais.

A ciência e a tecnologia podem nos ajudar em nossos empenhos, mas devemos sempre ter em mente que elas são forças potencialmente subversivas, que mais uma vez podem nos aprisionar se não forem usadas com correção.

Será útil dizer algumas coisas sobre política, onde as pessoas costumam procurar soluções

Os cristãos devem, em primeiro lugar, buscar um caminho diferente, começando com questionamentos como pano de fundo espiritual e histórico.

Tendo o pano de fundo religioso do problema, eles deverão articular um posicionamento ético antes de poder olhar para a política como responsável pela solução — uma abordagem superficial iniciada e terminada na política, cuja eficácia será apenas aparente.

Poderia mencionar, nesse contexto, as atuais discussões políticas relacionadas com armas nucleares, no âmbito global, e, como exemplo, as questões mais pessoais, as discussões sobre a legalização do aborto.

Suspeito que muitos cristãos considerem minha abordagem impraticável. No entanto, afirmo que aceitar a responsabilidade e normatividade permite grande variação de possibilidades e benefícios, e também um curso estável.

O curso atual da cultura de Babel pode parecer um caminho para a liberdade, mas o homem acabará encontrando-se prisioneiro da própria desorientação, em um curso que oferece nenhum futuro, apenas medo.

Quem se mantiver em contato apenas com o desenvolvimento real, corre o risco de sempre se acomodar a essa evolução. Já os que se orientam pela perspectiva do Reino de Deus, dada ao homem na graça, faz mais que se manter com os fatos.

Eles resistirão ao espírito de desenvolvimento ateu, e também vão aceitar as próprias responsabilidades para prosseguir na abordagem biblicamente normativa. A Bíblia nos dá os exemplos de José, no Egito, e Daniel, na Babilônia, e os exemplos das duas testemunhas em Apocalipse 11 também são encorajadores e esperançosos.

Considerações Finais

No final destes capítulos, concluo que devemos antes de tudo, aprender a ver o Reino de Deus como a meta final da história e dos nossos esforços culturais. Devemos sempre lembrar que o Reino de Deus é um presente outorgado, também concedido verdadeiramente agora, e, por fim, será conferido a nós mais uma vez no futuro.

A renovação final nos mostrará o verdadeiro significado dos nossos esforços culturais. Então, mesmo a Babilônia se tornará Jerusalém. Esse mistério divino, que nos foi revelado ao longo da história, não pode ser de todo compreendido; no entanto, trata-se de uma dinâmica que concede vida e merece nosso respeito, devoção, gratidão e senso de responsabilidade.

A visão normativa da vida na cultura que rejeita as expectativas culturais frenéticas e sua revogação imediata é descrita de forma mais precisa pelo profeta Jeremias na carta aos exilados na Babilônia. As palavras são serenas, mas repletas de expectativas:

Assim diz o Senhor dos Exércitos, o Deus de Israel, a todos os exilados que eu deportei de Jerusalém para a Babilônia: Edificai casas e habitai nelas; plantai pomares e comei o seu fruto.

Tomai esposas e gerai filhos e filhas, tomai esposas para vossos filhos e dai vossas filhas a maridos, para que tenham filhos e filhas; multiplicai-vos aí e não vos diminuais. Procurai a paz da cidade para onde vos desterrei e orai por ela ao sua paz vós tereis paz. (29.4-7)

E: Eu é que sei que pensamentos tenho a vosso respeito, diz o Senhor; pensamentos de paz e não de mal, para vos dar o fim que desejais. (29.11)

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